Entrevista com Amanda Ruzza


1) Como está sendo seu ano de 2011? Sei que você tem alguns projetos novos...

2011 Tem sido um grande ano para mim! Estou desenvolvendo o meu projeto solo, tocando com grupos muito legais como o Drew Bourdeax Group, e fazendo gravações de pop e dance music. Realmente não tenho nada do que reclamar, me sinto muito abençoada de poder estar aqui tocando música com pessoas muito criativas e talentosas.

2) Você, antes de ir estudar e tocar fora, já tinha uma estrada aqui no Brasil. Dá pra fazer alguns paralelos entre a vida do músico aqui e aí nos U.S.A?

Ahhh… essa é uma pergunta muito complexa, que poderia ser respondida em um livro de umas 250 páginas - você acabou de me dar uma idéia, quem sabe um dia desses eu não começo a escrever sobre isso…hahaha…Em minha opinião existem muitas coisas em comum entre o mercado de Nova Iorque e o do Brasil.

Em ambos os lugares, os músicos tem uma paixão muito grande pela arte (e a meu ver, é por isso que o be bop e a bossa nova são estilos que se criaram nestes ambientes, dentro deste sentimento de paixão pela música).

De outro lado, eu percebi que em outros centros musicais dos EUA (como em Nashville) os músicos eram mais focados no lado “business” do que no artístico e criativo.

Mas voltando à Nova Iorque e o Brasil, as diferenças são de que apesar dos músicos serem movidos pela paixão, aqui as pessoas tendem a ser um pouco mais organizadas. Geralmente, todo mundo sempre aparece na hora combinada para ensaiar, e quando a casa noturna anuncia que o show é às 21:00 hs, é porque realmente vai ser às 21:00 hs!

A outra coisa é que eu sempre senti que (pelo menos em São Paulo) um dos fatores determinantes para se arrumar trabalho muitas vezes não era o talento, mas sim quem era amigo de quem. É obvio que aqui a parte política é muito grande, mas no final das contas quem vai arrumar a gig é a pessoa que chegar na hora certa, vestida da maneira certa, se comportar de uma forma agradável, aprender o repertório direito, e... tocar pra caramba. Em suma, geralmente, aqui as pessoas põem a qualidade do som do grupo acima das amizades.

3) Ainda está estudando ou agora é só pé na estrada?

No momento eu estou terminando um Bacharelado duplo (em jazz e humanas), enquanto trabalho como musicista por tempo integral: gravando nos estúdios, fazendo shows, viajando com artistas, etc… É uma vida muito ocupada, mas me sinto muito abençoada e agradecida por todas essas oportunidades maravilhosas que tenho tido de tocar com grandes músicos e estudar com professores formidáveis.

4) Muita gente ainda acha que no exterior as oportunidades pipocam em cada esquina, até que ponto isso é real?

Aqui existem mais oportunidades porque a economia é mais forte, então existe uma circulação maior de dinheiro e por consequência, existem mais casas noturnas com música ao vivo. Porém, aqui tem muito mais músicos que em qualquer cidade brasileira, então a competição é muito acirrada. Porque aqui existem baixistas de Israel, da Nigéria, Americanos (e de muitos outros países) que tocam samba que nem brasileiro. E estes mesmos caras tocam salsa que nem cubano, funk que nem Americano e por cima de tudo tem uma leitura excepcional!

Então, sendo que existe muita gente que toca muito bem, o nível é muito alto, e se o músico que chegar aqui não estiver preparado vai acabar sendo esquecido e o telefone não vai tocar. Mas, por outro lado (e isto é uma coisa que faz parte da cultura Norte Americana), se o músico toca bem pra caramba, se comporta direito e é pontual, ele vai ser chamado sempre e muita gente vai indicá-lo para outras gigs, porque no final das contas, uma das coisas mais legais sobre os Estados Unidos é que os Americanos realmente dão valor e apreciam as pessoas talentosas e que estão a fim de trabalhar duro para alcançar grandes objetivos.

5) Você pode nos falar sobre o Amanda Ruzza Group?

Este é um projeto que passou por um longo tempo de “gestação”.Antes de me mudar para Nova Iorque, eu sempre tinha me considerado uma “sideman/woman”, ou seja, uma baixista que acompanhava os outros grupos e tocava as músicas do pessoal – o que para mim ainda é uma grande paixão – mas depois de passar um tempo aqui acho que comecei a me sentir inspirada em ouvir tanta música original, de qualidade tão boa, que acabei compondo umas coisas. Então, sempre que as pessoas me chamavam para tocar umas “sessions” (ensaios informais onde o pessoal se junta e traz umas músicas para tocar e estudar juntos), eu levava as minhas composições. Assim por acaso, descobri que eu adorava compor, e depois disso não consegui parar de escrever. Então, o caminho natural foi de virar “band leader” e começar a tocar por aqui e desenvolver um projeto.

Não que eu só queira tocar as minhas músicas, mas tenho que confessar que compor e tocar os sons que estão no meu coração para o público exigente de Nova Iorque e descobrir que existe uma boa recepção têm sido uma das coisas mais gratificantes da minha carreira profissional.E por outro lado, eu me sinto muito lisonjeada de ter a contribuição de músicos maravilhosos como Mauricio Zottarelli, Mamiko Watanabe, Fernando Arruda, Lucas Pino, entre outros.

6) Recentemente Esperanza Spalding recebeu um Grammy.O quanto isso serve de motivação para você?

O interessante da vitória dela não é nem de que seja analisado do meu ângulo pessoal. Para mim o que acho importante sobre tudo isso é ser capaz de olhar este acontecimento de um ponto de vista da “comunidade global” dos músicos. A vitória da Esperanza influencia a todos nós (artistas do som) em dois aspectos: pessoal e profissional.

Do lado pessoal, essa conquista representa uma afirmação pra cada um de nós de que todas as horas em que nós passamos em casa trancada no nosso quarto praticando umas coisas super difíceis no nosso instrumento - e não tendo certeza se algum dia iríamos ter oportunidade de usar aquela tríade superimposta ou aquela quintina – valeram a pena. Porque a música da Esperanza tem uma qualidade muito otimista: o som das composições dela tem a capacidade de passar para o ouvinte (e ao estudante de música) um sentimento de que vale a pena estudar, fazer música vinda do coração; vale a pena se sacrificar em nome da música e das coisas que você acredita!

Já do lado profissional, este Grammy vai ajudar a todos os músicos do mundo, pois agora muita gente que nunca tinha consumido jazz (achando que era uma coisa muito burocrática ou de “gente velha”) vai desenvolver um “ouvido” para um estilo musical mais intelectualizado. Consequentemente acho que em geral nós músicos teremos mais atenção do público e da mídia. Então quem tem CD vai conseguir vender um pouco mais, as casas noturnas vão estar mais animadas para promover mais shows de jazz, música instrumental, e outros estilos que geralmente não estão no foco principal da mídia.

Para mim, o Grammy da Esperanza foi um momento histórico da música e que será discutido e ensinado durante muitos anos nas aulas de história da música como o dia em que pela primeira vez uma artista de jazz ganhou o Grammy de artista do ano, tendo somente 26 anos de idade!

7) Sei que você está trabalhando com o pessoal da LEXICON, qual produto você está usando?

Eu estou usando dois produtos deles: o primeiro é o plug-in chamado LXP. Ele é um conjunto de um monte daqueles racks de reverb caríssimos que até a uns anos atrás só os estúdios de alto nível tinham condições para comprar. E o mais legal de tudo é que o plug-in tem um preço acessível para todo mundo, então ele funciona muito bem tanto para quem grava em casa quanto para quem trabalha em estúdios grandes. No momento esse é o reverb que está sendo utilizado na maioria dos estúdios aqui de Nova Iorque. O legal desse plug-in é que além de usá-lo para as coisas que todo mundo usa (reverb nos vocais, caixa da bateria, etc…), eu tenho usado ele como uma alternativa para o baixo. Tenho conseguido tirar uns sons de baixo muito interessantes com esse plug-in.

O outro produto é a interface de audio I-ONIX FW 810S. Para mim é um equipamento maravilhoso porque funciona com Firewire em qualquer programa e já vem com uns compressores dentro. Então, se eu quiser gravar um show ao vivo, é só plugar e gravar pois não tenho que me estressar pensando que de repente, se o baterista tocar mais forte, o canal vai distorcer e também não tenho que trazer nenhum equipamento extra. Só a interface, o laptop e os microfones.

8) Para nós baixistas o caminho da produção musical é algo natural, até que ponto você tem o controle do seu trabalho dentro de um estúdio?

Bom, em relação ao meu trabalho como baixista de estúdio, acho muito importante que eu possa chegar com o meu “som pronto” antes mesmo de por o pé no estúdio. Porque a verdade é que por mais que um músico esteja gravando no “melhor estúdio” com o “melhor técnico”, ninguém nunca vai dar importância ao teu som quanto você mesmo. E outra, geralmente em uma produção as pessoas estão com a cabeça super ocupada com mil coisas para fazer e a última coisa que eles querem pensar é na qualidade perfeita do som do baixo.

Então o que eu faço é me preparar na noite anterior: troco as cordas e as baterias. E quando eu chego para gravar trago o meu equipamento, porque eu sei que não importa o que vai acontecer depois, o som do baixo vai estar sempre presente.

Eu ligo o baixo numa Direct Box da BSS e depois num compressor da DBX (o 160SL). Fica muito legal! Aí dependendo da música que está sendo gravada, eu mudo o nível de compressão, o timbre do baixo ou a posição dos captadores, mas a idéia é sempre a mesma.

Eu também levo um monte de pedais (sou fã dos pedais baratos da MXR!). Ultimamente os produtores (principalmente o pessoal de dance music) estão curtindo gravar dois canais simultâneos de baixo: um limpo e o outro com efeitos.

Pessoalmente, eu acho que quando o baixista chega ao estúdio com um som legal e tocando do jeito que o produtor quer ouvir o groove, não existem problemas de controle, pois se você foi chamado é porque eles gostam do teu som, então não vão ficar editando e mexendo com o que você tocou.

9) Quando veremos você tocando aqui no Brasil?

Eu estou muito empolgada e gostaria de dizer que vou tocar no Brasil pela primeira vez desde que sai! Vai ser em julho, através do IASJ – o congresso internacional de todas as escolas de jazz do mundo – que vai acontecer no Souza Lima em São Paulo. Pra mim vai ser uma emoção muito grande, e não vejo a hora!

10) Pra finalizar: Depois de tantos anos no exterior, não dá vontade de voltar a morar e trabalhar aqui no Brasil?

Sim. Porque por mais que exista Skype, email e todas as ferramentas maravilhosas que a internet nos proporciona, existem coisas que são insubstituíveis, como por exemplo: sentir o cheiro de pão fresco das padarias às 5 da manhã depois de voltar de uma gig que foi até tarde da noite, tocar muita música brasileira, assistir ao futebol…Eu como boa brasileira amo o meu país e vou sempre considerar a possibilidade de voltar.

Foto da Matéria - Samantha Knoop

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